No circuito da administração
e negócios, avistamos placas lembrando do lado humano de qualquer coisa. Da
empresa, do trabalho, da qualidade, da qualidade de vida, da negociação, da
comunicação, da remuneração e até das pessoas!
Enquanto aguardo o lado
humano dos direitos humanos, surge a questão: quantos lados tem um humano?
Em tempos partidários, os
lados são muitos. Muitos mudam de lado. E você, cara pálida, de que lado está?
Mas insisto na pergunta: quantos lados tem um humano?
Sou tentado a responder
“dois lados: o de dentro e o de fora”. Mas é uma resposta longe da sublimação
pretendida, tipo sentido da vida, até por me faze lembrar de outro sentido da
vida (Meaning of Life, do Monty Python) e de A Comilança, de Marco Ferreri.
Gosto de ambos os filmes mas não acho que as cenas escatológicas traduzam
completamente o nosso lado de dentro. A frase “ o homem é aquilo que come” foge
do entendimento literal e clama por metáforas e analogias.
A analogia que me ocorre com
a questão ao lado, não para deixá-la de lado, é com a geometria.
A geometria tradicional –
chamada euclidiana, devido aos axiomas de Euclides, na obra Elementos - é o
ramo da matemática que se refere às propriedades dos pontos (de vendas?),
linhas (de produtos?), sólidos (conhecimentos?) e superficiais (áreas?), e à
maneira pela qual eles se relacionam uns com os outros. Assim, a geometria se
preocupa com as noções de comprimento (tamanho de sala e mesa ainda é documento),
ângulo (de uma maneira de ver as coisas), paralelismo (gerentes e equipes que
nunca se encontram), perpendicularidade (você em pé, parado, esperando ser
chamado para a reunião), similaridade (que derruba a política de diversidade),
congruência (tá rindo de quê?), área (de trabalho), volume (de vendas), razão (a
empresa tem razões que os próprios empregados desconhecem) e proporção
(enquanto mais se trabalha... mais se trabalha).
Os pensadores renascentistas
viam uma certa perfeição matemática na forma humana. Leonardo da Vinci (1452 –
1519), gênio do Renascimento, era pintor, cientista, anatomista, engenheiro,
matemático, escritor, músico, naturalista, filósofo, escultor e ainda
arquiteto, embora a construção o tivesse interessado menos que os problemas
básicos do traçado e da estrutura.
Durante o apogeu do
Renascimento, Da Vinci, o anatomista, preocupou-se com os sistemas internos do
corpo humano. Da Vinci, o artista, interessou-se pelos detalhes externos da
forma humana, estudando exaustivamente as suas proporções. O Homem de Vetruvio,
que resulta desses interesses, é a imagem que representa o corpo humano inserido
na forma ideal do círculo e nas proporções do quadrado. A imagem foi usada pelo
matemático Luca Pacioli na ilustração de sua obra De Divina Proportione.
Estamos cientes de nossas proporções?
Sabemos qual é o nosso raio de ação? Nosso alcance? Espero ainda que não
tenhamos desaprendido a calcular a altura de um homem. Como temos calculado
nossa própria altura: pelo que temos ou pelo que somos? Pela existência ou pela
essência? Alteza, título honorífico de reis, inicialmente, e depois apenas de
príncipes, é também sinônimo de altura. Ter alteza é saber que a verdadeira
nobreza é nossa elevação moral.
Da Vinci tinha grande
admiração pela matemática (“Não existe certamente nada em que as ciências
matemáticas não possam ser aplicadas”) e dizia que o artista deveria ser um bom
conhecedor da perspectiva. Precisamos como nunca de perspectivas.
* Texto de Luis Adonis Correia - autor dos
livros Quem Roeu a Roupa do Rei e Um observador Nunca Está à Paisana.